Tudo bem; esqueça a literatura. Vamos apenas dar um passeio. Não vai ser bonito, mas não temos escolha. É madrugada e não temos mais para onde ir. Gostaria de pedir que não tenha medo, mas talvez isso seja pedir demais. Adentre os quartos. No fim, lá no fim, há pureza. Ao fim do corredor – ou no pátio lá atrás – talvez esteja tudo em paz. Entretanto, para chegar lá, temos que colocar os móveis em ordem. Não vai ser fácil, mas acho que isso você já sabe. Se não sabe, a dor ensina.
Pode gritar se quiser. Com todas essas vozes gritando pelos quartos enquanto passamos dificilmente alguém notará. E se quiser chorar, bem, a casa é sua. E os choros são muitos, então, não se constranja. Mas seja natural. Não force nada. Em alguns destes quartos serão encontradas coisas perigosas. Em alguns destes quartos teremos que destrancar as portas. Abrir portas que nem sabíamos que existiam. E talvez não existissem. A casa as criou, junto com esses novos quartos. Há umidade e escuridão. Há vontade de parar. Há vontade de apenas dormir, seguir essa caminhada quando o sol estiver iluminando o corredor. Mas e se amanhecer nublado? Talvez o melhor seja abandonar a casa.
Não, isso não pode ser feito. Ela precisa ser posta em ordem. Ela está esperando anos por isso. Arrume-a antes que o tempo a consuma. Porque o tempo, esse miserável insensível, não vai esperar. Por enquanto contente-se em lotar esse longo corredor com palavras. Ele vai diminuindo à medida que elas são escritas. Tatue sua dor na parede. Ela vai ser lavada em breve. E tudo será esquecido. O buraco é fundo, mas ainda não começaram a jogar a terra. Ainda há tempo para sair. Onde está a chave? As respostas não virão tão fáceis. Onde está a chave? Para que quer as chaves? Desistir? Abandonar tudo? De novo. Não. As chaves serão encontradas na hora certa. E onde está o relógio que marca a hora certa?
Descarregue tudo. Coloque para fora. Chore oceanos e inunde o corredor. Dói, mas os quartos serão lavados. Tudo de ruim que houver transbordará para fora das janelas. Não com lágrimas, mas com palavras. Choradas sobre o corredor. Mais calmo agora? Continue. Ou não? Talvez seja o suficiente por hoje. E se não pudermos mesmo sair da casa, ela estará aqui amanhã. E depois, e depois.
E com ou sem sol, chegaremos até o pátio, onde a grama está bem cortada e as flores brincam junto com as crianças, felizes. E então, finalmente, encontraremos nossa paz.
Legal, vim aqui apenas visitar o blog, não sabia que o texto tinha sido publicado.
ResponderExcluirPena que o pessoal não foi no Entrevista Poética com o Altair, estava memorável.
Abraços a todos, além de nossos corredores, e até terça!